Exemplo maravilhoso de uma alma salva por um ato de caridade perfeito praticado no momento da morte é-nos contado pelo Padre Chiavarino, autor do célebre livro “O triunfo da misericórdia".
O fato se passou com a mãe do Padre Hermann Cohen, o qual se converteu do judaísmo para a Igreja Católica.
Nascido em 1820, numa rica família judia de Hamburgo, Hermann destacou-se desde cedo pelos dotes musicais, sendo acolhido pelo compositor Franz Liszt, que o considerava seu discípulo predileto. Ainda jovem foi residir em Paris, onde passou a viver nos meios artísticos, rapidamente caindo numa vida dissoluta e cheia de pecados.
Atraído pela beleza da liturgia católica e pela presença real de Nosso Senhor Jesus Cristo na Eucaristia — após um período de grandes provações e lutas interiores, converteu-se à verdadeira Religião, sendo batizado aos 27 anos de idade. Professou como religioso carmelita em 1850, com o nome de Frei Agostinho Maria do Santíssimo Sacramento.
Após sua ordenação sacerdotal, realizada em 1851, tornou-se pregador incansável, viajando por todas as partes, fundando e restaurando conventos da Ordem carmelita. Instituiu em Paris, na Basílica de Nossa Senhora das Vitórias, a Adoração Noturna ao Santíssimo Sacramento. Foi amigo íntimo de São Pedro Julião Eymard, fundador dos Sacramentinos; de São João Maria Vianney, o célebre Cura de Ars; do Beato Papa Pio IX; e protegeu Santa Bernardette Soubirous, a vidente de Lourdes, numa fase em que ela sofria incompreensões e até perseguições por parte de eclesiásticos que não acreditavam na veracidade das aparições.
Aplicou à música sacra seu imenso talento artístico, chegando a publicar cinco coleções de composições musicais, e escreveu obras de espiritualidade e de História eclesiástica.
Após a Guerra Franco-Prussiana, valendo-se de sua nacionalidade alemã, que nunca perdera, obteve licença para acompanhar soldados franceses que foram levados como prisioneiros para a Alemanha, assistindo-os como capelão. Teve morte heroica em 1871, em Spandau, vitimado pela varíola, que contraiu por ter querido dar assistência espiritual, embora consciente do perigo que corria, a prisioneiros atingidos pela terrível doença.
Foi sem dúvida uma das grandes figuras da História eclesiástica do século XIX.
Um fato pouco conhecido de sua vida refere-se à surpreendente conversão de sua mãe. Inúmeras vezes o Padre Hermann tentou convertê-la à Igreja Católica, mas ela sempre se recusou a abandonar o judaísmo.
Passemos a palavra ao Padre Chiavarino, que narra a maravilhosa conversão da senhora Cohen, no momento mesmo de expirar:
"Tendo permanecido judia, apesar dos pedidos e instâncias reiteradas de seu filho, a mãe do Padre Hermann morreu, ao menos aparentemente, numa obstinação completa.
"Angustiado, o pobre padre foi um dia confiar sua aflição ao santo Cura de Ars. Foi ótimo o resultado! Pois o homem de Deus lhe assegurou logo e lhe disse que um dia, na festa da Imaculada Conceição, lhe seria entregue uma carta que lhe daria grandes consolações. Era mais do que suficiente para acalmar as inquietações do humilde religioso e enchê-lo de alegria.
"Ora, seis anos mais tarde, no dia 8 de dezembro de 1861, um padre da Companhia de Jesus veio lhe entregar a carta anunciada por São Vianney. Tinha-lhe sido enviada por uma santa religiosa, que morreu um pouco mais tarde, em odor de santidade.
"A leitura desse precioso documento fez saber ao Padre Hermann que foi no último segundo que a separava ainda da eternidade que sua mãe se convertera, e que ela devia esta graça insigne à comovente intervenção da Mãe de Deus!
(...) [as palavras a seguir são textuais da religiosa que recebeu a revelação]
"No momento em que a mãe do Padre Hermann estava a ponto de dar o último suspiro, quando ela parecia sem conhecimento e quase sem vida, Maria, nossa boa Mãe, se apresentou diante de seu Divino Filho e, prosternando-se a seus pés, Lhe disse: — Graça, piedade, ó meu Filho, para esta alma que vai perecer! Mais um instante e ela estará perdida, perdida para a eternidade! Fazei, eu Vos suplico, pela mãe do meu servo Hermann o que Vós quereríeis que ele fizesse pela vossa se ela estivesse em seu lugar e Vós estivésseis no dele. A alma de sua mãe é o seu bem mais querido; mil vezes ele ma consagrou; ele a confiou à ternura e à solicitude de meu Coração. Poderia eu tolerar que ela pereça? Não, esta alma é minha propriedade, eu a quero, eu a reclamo como uma herança, como preço de vosso Sangue e de minhas dores ao pé da cruz!"
"Logo que a Divina Suplicante tinha cessado de falar, uma graça forte, poderosa, saiu da Fonte de todas as graças, do Coração adorável de Nosso Salvador, e veio iluminar a alma da pobre judia e triunfar instantaneamente de sua obstinação e de suas resistências. Esta alma se voltou imediatamente com uma amorosa confiança para Aquele cuja misericórdia a perseguia até entre os braços da morte e Lhe disse: — Ó Jesus, Deus dos cristãos, Deus que meu fílho adora, eu creio, eu espero em Vós, tende piedade de mim!".
"Depois de me ter mostrado todas estas coisas, Nosso Senhor acrescentou: — Dá a conhecer isto ao Padre Hermann; é uma consolação que Eu quero conceder a seus prolongados sofrimentos, a fim de que ele abençoe e faça abençoar em toda a parte a bondade do Coração de minha Mãe e seu poder sobre o meu Coração".
(Transcrição de "O Desbravador", n°s 215-216, novembro/dezembro de 1997).