Mostramos que somos cristãos. - Nós, cristãos, por quem Jesus Cristo deu a Sua vida, a quem Jesus Cristo trata não como servos, mas como amigos, devemos preferir a qualidade inestimável e o belo nome de cristão, a toda a glória humana; devemos confessar publicamente o Seu santo nome não somente no conselho dos justos, mas ainda, e principalmente, no meio da assembléia dos pecadores; cumprir a Sua lei, praticar os nossos deveres sem temores, nem respeitos humanos.
Quais são as ameaças ou os suplícios que detém um cristão na confissão da sua fé, no serviço de Deus?
Ameaçado de lhe tirarem os bens, São João Crisóstomo responde: tudo o que possuo é dos pobres; tirando-mos não fazeis injustiça a mim, mas aos pobres; ameaçado na sua liberdade responde: Eu beijarei com amor as cadeias que me prendem porque ao menos sou livre em Jesus Cristo; ameaçado de exílio responde: A minha verdadeira pátria é o Céu; ameaçado na sua vida responde: Chegarei mais depressa ao Céu, a ver a Deus, único fim de todos os meus desejos.
E esta atitude de São João Crisóstomo tem sido a de doze milhões de mártires e de uma multidão inumerável de cristãos a quem nem a pobreza, nem o pecado, nem a morte, nem a fraqueza, nem as cruzes, nem os dentes das feras podem levar a praticar um ato de condescendência reprovado pela sua consciência; - Nego a Cristo!
- Os cristãos fracos temem um sorriso à flor dos lábios, uma troça.
Durante as perseguições dos primeiros séculos do Cristianismo, um humilde cristão foi preso e conduzido diante da estátua de Júpiter. Dizem-lhe aí:
- “Lança incenso no fogo e sacrifica aos nossos deuses!”
- “Não!” responde ele energicamente.
Começam a torturá-lo; não se queixa. Levantam-lhe o braço de maneira que a mão fique, precisamente, em cima da chama e põem-lhe incenso na mão:
- “Deixa cair o incenso e deixamos-te ir em liberdade!”
- “Não!” responde ainda Barlaam. E fica imóvel de braço estendido.
A chama eleva-se e começa a lamber a mão; o incenso fumega já; mas o homem não se move. A mão queima-se com o incenso, mas Barlaam prefere o martírio a renunciar à sua fé, ao seu Deus. - Um coração de bronze!
Quando Madalena soube que Jesus se encontrava em casa de Simão, tomou um vaso de alabastro cheio de aromas e foi a toda a pressa derramá-lo sobre a cabeça do Salvador. E logo começaram muitos a murmurar, a indignar-se, a ranger os dentes, dizendo: Ut quid perditio haec? Para quê este desperdício? Quantos pobres morrem de fome e de frio e que ela poderia alimentar e vestir, se, em vez de ir comprar aromas, fosse comprar pão e agasalhos para os pobres! Ela que tinha gasto tanto dinheiro em jóias, banquetes e diversões! Pensais que então algum lhe chamava esbanjadora, cara a cara? Pelo contrário, todos aplaudiam os seus excessos. Quando, porém, faz das suas profanidades um ato de culto ao seu Deus a quem tão tarde começou a amar, eis que imediatamente se soltam as línguas em mil afrontas, assanham-se contra ela e ultrajam a pobre mulher.
Vejamos, por aqui, quanto parecida foi, em todos os tempos, a sorte daqueles que se resolveram a voltar as costas ao mundo e servir generosamente a Jesus Cristo. “Todos aqueles que querem viver piedosamente em Jesus Cristo, diz o Apóstolo, hão-de sofrer perseguição.” (II Tim. III, I2).
Tornamo-nos semelhantes a Jesus Cristo. - Na vida de Santo Henrique Suso conta-se que o servo de Deus fazia as mais ásperas penitências; mas, em certa ocasião, disse-lhe Deus que ainda tinha de sofrer coisa de maior merecimento e custo e que, para saber o que era, abrisse a porta da cela. Assim o fez. E viu no dormitório um cão com um trapo na boca e umas vezes o mordia e outras vezes o lançava para um canto. Disse-lhe Nosso Senhor que se dispusesse a ser tratado como aquele trapo e aprendesse dEle a sofrer, ainda que o desprezassem e mordessem com injúrias.
Começaram, em breve, as perseguições e aos olhos do mundo, parecia um trapo desprezível, mordido dos cães furiosos e aos olhos de Deus, era uma pedra preciosa de muito valor que com aqueles golpes ficava cada vez mais polida.
Porque é que valem mais as perseguições e injúrias sofridas com humildade e paciência do que penitências feitas com rigorosa austeridade? É que assim nos tornamos mais semelhantes a Jesus Cristo. Foi humilhado na Sua divindade na Sua alma e no Seu corpo.
Portanto a tinta das injúrias, que a muitos só parece lançar no crédito, é na verdade, a tinta com que se tem feito preciosas cópias e retratos de Jesus Cristo.
Alcançamos muitos méritos. - Qual foi o principal merecimento do patriarca Abraão no seu sacrifício? Foi a obediência pronta, heróica, em executar as ordens de Deus? Não: o principal mérito do santo patriarca consistiu em não olhar ao que dirão, em desprezar com espírito magnânimo os ditos a que a sua obediência o expunha. Vendo-o tomar o cutelo, diriam: aquilo é um bárbaro: vendo-o descarregar o golpe, sem derramar uma lágrima, sem lançar um ai, sem desviar sequer o rosto, acrescentariam: aquilo é um tigre e não um homem, um algoz e não um pai!
Não temeu, diz São Zenão, que o tivessem por cruel e filicida: antes, para mostrar a sua submissão, alegrava-se de Deus, Nosso Senhor, lhe ter ordenado sacrifício tão penoso. Está nisto o incomparável mérito do grande patriarca.
Imaginemos que todo o mundo em vez de nos escarnecer e motejar nos louva e aplaude por sermos cristãos. Neste caso, quem deve e a quem? Deus a nós ou nós a Deus? “Os devedores, somos nós a Deus, diz São João Crisóstomo, devedores lhe somos da honra que nos tributam; mas se somos escarnecidos e motejados por Sua causa, Deus se faz nosso devedor.” Que coisa podemos desejar mais do que ter próprio Deus por devedor? Deus paga, cento por um, neste mundo e depois, o reino dos Céus.
Reflexões e resoluções. - Agora, com os olhos da minha alma fixos em Jesus Crucificado, faço reflexões sobre a virtude sobrenatural da fé e tomo as resoluções de desenvolver e aperfeiçoar em mim esta grande virtude pela oração, dizendo com os Apóstolos: Senhor, aumentai em mim a fé; pelo exercício constante praticado freqüentes atos de fé como está escrito: “O justo vive da sua fé” e de professar sem temores nem respeitos humanos, de maneira que à hora da minha morte possa repetir como o Apóstolo São Paulo: - Cursum consummavi, fidem servavi;cheguei ao fim da minha vida e, durante toda ela, mostrei por obras que fui sempre verdadeiro cristão.
Maria Santíssima, minha boa Mãe, ajudai-me a ser fiel a estas resoluções. Assim seja.
(O Crucifixo meu Livro de estudo, pelo Cônego Júlio Antônio dos Santos, 1950)
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